Trump tenta culpar democratas por ‘shutdown’ e pressiona Senado a acabar com ‘filibuster’, que dá poder à minoria
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Com seu governo profundamente afetado pelo “shutdown” do governo americano, a paralisação de serviços federais devido à falta de acordo entre republicanos e democratas no Congresso, o presidente dos EUA, Donald Trump, tem pressionado seus próprios aliados para acabar com uma ferramenta legislativa do país que dá poder à minoria democrata: o “filibuster”.
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“Chegou a hora de os republicanos jogarem sua ‘CARTA TRUMP’ e partirem para o que é chamado de Opção Nuclear — Acabar com o filibuster, e acabar com ele AGORA!”, escreveu Trump em suas redes sociais.
🤔 O que é isso? O filibuster é uma antiga ferramenta legislativa existente nos EUA que impede a tramitação dos projetos de lei, a menos que 60 senadores votem a favor. O termo se refere a qualquer manobra prevista no regimento para obstruir uma votação. A mais famosa é usar o direito de fala em plenário para discursar por horas, de forma a esgotar o tempo para a votação da matéria — na prática, porém, qualquer ação que dificulte a obtenção de 60 votos para um projeto essencial é chamada de filibuster.
Foto do Senado dos EUA, no Capitólio, em Washington, na madrugada de terça-feira, 8 de novembro de 2022
J. Scott Applewhite/AP
Ao longo dos anos, o filibuster tem frustrado projetos políticos tanto de governos democratas quanto republicanos, e Trump vem reclamando dela desde seu primeiro mandato na Casa Branca.
Para passar pelo Senado, o projeto orçamentário proposto pelos republicanos precisa de três quintos dos votos na Casa (ou seja, da aprovação de 60 dos 100 senadores). A maioria republicana, no entanto, conta com 53 cadeiras, sendo necessário o apoio de pelo menos 7 democratas.
O apoio de parte do partido rival no Legislativo dos EUA quase sempre foi imprescindível ao longo da história do país. A crescente polarização fomentada pelo trumpismo, porém, tem tornado cada vez mais difícil a convergência bipartidária.
Os democratas dizem que só aprovarão o projeto caso programas de assistência médica que estão prestes a expirar sejam prolongados. Já os republicanos de Trump insistem que saúde e orçamento devem ser tratados como questões separadas.
Em entrevista exibida no domingo (2), Trump afirmou que “não se deixará ser extorquido” pelos democratas que exigem negociações para estender os subsídios para a saúde. Ecoando os republicanos no Congresso, o presidente disse no programa “60 Minutes”, da CBS, que só negociará quando o governo reabrir.
Trump disse que os democratas “perderam o rumo” e previu que eles cederão aos republicanos. “Acho que eles terão que ceder”, disse Trump. “E se eles não votarem, o problema é deles.”
Sem acordo nem votação, o atual “shutdown” segue em vigor e deve se tornar o mais longo da história dos EUA, caso não seja encerrado nesta semana. A paralisação mais longa aconteceu durante o primeiro mandato de Donald Trump e durou 35 dias, entre 2018 e 2019.
Com o governo impedido de gastar, milhares de servidores públicos serão colocados em licença, enquanto outros, que trabalham em serviços essenciais, podem ter os salários suspensos. A remuneração será paga de forma retroativa quando o orçamento for normalizado.
Hesitação republicana
Para sair da crise, Trump tem voltado a pressionar os líderes de seu partido para que alterem as regras do Senado e acabem com o filibuster.
Os senadores republicanos, porém, têm rejeitado repetidamente essa ideia desde o primeiro mandato de Trump, argumentando que a regra que exige 60 votos para superar quaisquer objeções no Senado é vital para a instituição.
Acabar com o filibuster durante a atual legislatura parece ser a solução mais cômoda para os republicanos agora — mas eles sabem que, no futuro, com o Senado tendo uma eventual maioria democrata, a falta desse instrumento deixaria o caminho livre para a aprovação de pautas contrárias à sua agenda.
Os republicanos esperam que pelo menos alguns democratas mudem seus votos, já que moderados vêm negociando há semanas com republicanos de base possíveis acordos que poderiam garantir votos suficientes para a aprovação do projeto de lei de saúde em troca da reabertura do governo. Os republicanos precisam de mais cinco votos democratas para aprovar seu projeto.
História do filibuster
Ao contrário da Câmara dos Representantes, o Senado impõe poucas restrições ao direito de fala dos legisladores. Mas os senadores podem usar as regras da Casa para dificultar ou bloquear votações. Isso é o que, na prática, é o filibuster — um termo que, segundo registros do Senado, começou a aparecer em meados do século XIX.
Mas a forma como o filibuster é usado hoje não se assemelha à tática “clássica” de ocupar o plenário com discursos que podem passar de 20 horas de duração.
Agora, os senadores informam seus líderes — e muitas vezes confirmam publicamente — que irão obstruir um projeto de lei. Não são necessários discursos longos. No entanto, o Senado ainda precisa reunir 60 votos para superar esse obstáculo. Se conseguirem, os senadores poderão prosseguir para a aprovação final, que requer apenas maioria simples.
O regimento do Senado já foi mudado anteriormente para acabar com os filibusters, mas apenas para nomeações presidenciais para o Judiciário, exceto juízes da Suprema Corte. Isso ocorreu em 2013, quando os democratas estavam fartos das repetidas obstruções republicanas às nomeações do presidente Barack Obama, especialmente para o Tribunal de Apelações dos Estados Unidos para o Circuito do Distrito de Columbia.
Essa é a chamada “opção nuclear”, citada por Trump.
Outra opção para se driblar o filibuster seria alterar o regimento do Senado, em particular a Regra XXII: estabelecida em 1917, ela determina a invocação da “cloture”, ou interrupção do debate, que força a aprovação de uma matéria por maioria simples.
A “cloture”, no entanto, precisa de três quintos dos votos (60, com todas as cadeiras ocupadas) para que ela seja invocada. Para alterar o regimento, seriam necessários dois terços dos votos da Casa para afrouxar a exigência dos três quintos.
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