Com crescente tensão entre EUA e países latinos, Brasil tem de ter cautela em negociação com Trump, avaliam diplomatas
Trump chama Gustavo Petro, presidente da Colômbia, de ‘traficante de drogas ilegal’
O governo brasileiro vê com preocupação o aumento da tensão entre os Estados Unidos e países da América Latina, como Venezuela e Colômbia. Mas o alerta não se dá só pela questão territorial ou de instabilidade na região.
A crescente troca de ameaças entre Donald Trump e os governos venezuelano e colombiano pode atrapalhar um momento crítico de negociação entre Brasil e Casa Branca, em que Lula e Trump tentam se entender para discutir o tarifaço.
Depois do encontro entre o ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, e o secretário de Estado dos Estados Unidos, Marco Rubio, na última quinta-feira (16), ficou acertado que uma primeira reunião técnica, entre negociadores brasileiros e uma equipe do governo norte-americano, será agendada para os próximos dias, de forma virtual.
O diálogo ocorre em meio a uma forte crise nas relações bilaterais, iniciada em julho, quando Trump anunciou tarifas de 50% a produtos brasileiros importados pelos americanos. Os EUA alegaram que o Brasil adota práticas desleais de comércio e promove uma “caça às bruxas” contra o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). As tarifas entraram em vigor no início de agosto.
A mudança na relação entre os dois começou após um breve encontro nos bastidores da Assembleia Geral da ONU, em 23 de setembro, e foi seguida por um telefonema de 30 minutos entre Lula e Trump no dia 6 de outubro, no qual foram abordados temas econômicos, incluindo o tarifaço.
Críticas a países latino-americanos
Neste domingo (19), Trump elevou o tom da crise ao chamar o presidente colombiano, Gustavo Petro, de “traficante de drogas ilegal” que incentiva a “produção massiva” de entorpecentes.
Ele afirmou ainda que os EUA vão cancelar “pagamentos e subsídios em larga escala” ao país sul-americano e alertou Petro de que “é melhor encerrar” as operações de drogas “ou os Estados Unidos as encerrarão por ele, e não será feito de forma gentil”.
Mais cedo, também neste domingo, Petro acusou o governo dos EUA de assassinato e exigiu respostas após o mais recente ataque americano em águas do Caribe.
Os ataques ocorrem em uma região próxima à costa da Venezuela, onde Trump admitiu ter autorizado ações da Agência Central de Inteligência (CIA). O governo venezuelano, que enviou caças, submarinos e navios de guerra, não descarta uma invasão por terra.
Segundo Trump, a operação busca combater os cartéis de drogas venezuelanos. Os EUA também acusam o presidente do país, Nicolás Maduro, de liderar o Cartel de los Soles, grupo classificado recentemente pelo governo Trump como organização terrorista internacional.
Lula pretende alertar Trump sobre Venezuela
Em meio à escalada da tensão, Lula planeja comentar a crise na Venezuela no encontro presencial que deve ter com Trump, ainda sem data marcada.
Auxiliares afirmam que o presidente brasileiro pode usar um tom de alerta sobre a situação, querendo deixar claro a Trump que uma intervenção militar americana na Venezuela irá desestabilizar toda a região, criando um cenário mais propício para o narcotráfico.
Na quarta-feira (15), o presidente dos EUA afirmou ter autorizado operações secretas da CIA em território venezuelano e disse estar estudando ataques terrestres contra cartéis do país.
Encontro ‘fundamental’
O governo brasileiro avalia que é muito importante que a reunião entre Lula e Trump aconteça ainda em 2025. Lula embarca nesta terça (21) para a Malásia, para participar da cúpula da Associação de Nações do Sudeste Asiático (Asean).
O Planalto e o Itamaraty trabalham com a possibilidade de que o encontro bilateral aconteça durante essa viagem, mas ainda há incertezas sobre a compatibilidade das agendas dos dois mandatários.
Segundo auxiliares do governo, há um esforço em andamento para construir a reunião Lula-Trump este ano. Diplomatas acreditam que, uma vez realizado, o diálogo presencial em mais alto nível, entre os dois presidentes, dará um norte para a discussão.
“Há, no horizonte, muitas tentativas externas de pautar agendas paralelas e atrapalhar a relação bilateral. Tem muita espaçonave desgovernada no caminho, e a presença dos chefes de Estado, o quanto antes, é fundamental para impedir qualquer interferência”, disse uma fonte.
O Palácio do Planalto recebeu indicativos da Casa Branca de que os americanos também enxergam como ideal organizar a reunião com rapidez.